Saúde do corpo e da mente é o principal aspecto para justificar a percepção do bem-estar, seja ele bom ou ruim

A gerente de engajamento global Isadora Alves, de 27 anos, é praticante da Ashtanga, sistema de yoga com séries de posturas integradas a movimentos de transição. “Eu procuro exercícios que demandam mais, são mais ativos. A yoga tem muito a ver com saúde mental também, até pelo fato de prestar atenção na respiração, de olhar para dentro, de ser um momento de introspecção.”

Para Isadora, o autocuidado está diretamente associado ao seu bem-estar, em uma rotina que conta com exercícios físicos, meditação e psicanálise. “Eu tinha ansiedade, uma mente inquieta que me deslocava para o passado e para o futuro. Quando estou em movimento, a mente foge menos e me obrigo a estar no presente.”

A relação entre bem-estar e saúde é corroborada por uma pesquisa nacional do Instituto Informa, que entrevistou mil pessoas no início de março para medir sua satisfação com a própria vida. O estudo aponta que três a cada quatro brasileiros julgam positivamente o bem-estar, atribuindo notas de 7 a 10 a partir de uma percepção individual. Outros 20,1% classificam o bem-estar como moderado (notas 4 a 6) e 4,2% dizem ser ruim (notas 1 a 3).

Perguntados sobre o aspecto da vida que melhor explica a avaliação, a saúde do corpo chega a 23% e, a saúde mental, a 18,3% – ou seja, 41,3% dos entrevistados veem na saúde a protagonista para aferir seu bem-estar. Entre os que deram notas mais altas, a saúde do corpo (23,8%) e da mente (17,9%) somam 41,7%. Para os moderados, o percentual somado fica em 39,4% e, entre as notas mais baixas, 56,1% ressaltam a saúde do corpo (31,7%) ou da mente (24,4%) nas respostas.

O levantamento também perguntou sobre o aspecto que mais produziu bem-estar no último mês. Daqueles que destacaram saúde ou saúde mental, 21,8% apontaram passeios, seguido por estabilidade no emprego (15,5%), serviços públicos (14,5%), viagens (11,4%), confraternizações (9,9%) e encontros (9%).

“O bem-estar está muito ligado a ter contato com aquilo que preenche, que entrega emoções agradáveis, que faz sentido para as pessoas. E o cuidado com a saúde, além da autoestima, também tem impacto na prevenção de doenças, na cognição e na regulação de emoções. É tudo interligado”, afirma a psicóloga Natália Megale.

Para além da pressão social

O Brasil tem a maior prevalência de casos de depressão e ansiedade do mundo – são, respectivamente, 11,7 milhões e 18,6 milhões de diagnósticos, que equivalem a 5,8% e 9,3% da população. Segundo o psicanalista Marcelo Veras, da EBP (Escola Brasileira de Psicanálise), o mundo cada vez mais conectado à internet contribui para agravar esse quadro. 

“Havia uma ilusão de que as redes sociais surgiram para nos comunicarmos, mas hoje elas se tornaram grandes caixas de ressonância de espelho. Todos tentam mostrar seu melhor ângulo, com filtros. E isso moldou uma legião de sujeitos frustrados, em constante comparação e imersos em uma solidão conectada.”

Isadora defende a necessidade do autocuidado que olhe para si, sem se deixar influenciar pelas pressões estéticas da sociedade. “Eu comecei a me exercitar e senti vontade de ter uma alimentação mais saudável. A partir daí, senti meu organismo funcionando melhor, passei a dormir em horários mais adequados, meu sono melhorou. Uma coisa vai puxando a outra. Se a pessoa só vê o exercício como algo estético, a fim de chegar a um tipo de corpo, esse esforço não vai fazer bem para a mente.”

O poder da terapia (dentro e fora da sessão)

Ao mesmo tempo que especialistas afirmam que vivemos na “era da ansiedade”, a busca por atendimento profissional voltado aos cuidados com a saúde mental ainda é pequena. Em 2023, a pesquisa Panorama da Saúde Mental, do Instituto Cactus e da AtlasIntel, revelou que apenas 5% dos brasileiros fazem psicoterapia no País, mas 16,6% fazem uso contínuo de remédios psicoativos.

“Não há a possibilidade de uma boa saúde mental poupar o ser humano da perda, da dor ou da frustração. Eu acredito que faz parte do bem-estar não apenas pensar nas coisas positivas, mas buscar a melhor relação possível com esse sofrimento”, explica Veras.

Natália Megale ressalta a importância da terapia, mas alerta que o processo deve ser contínuo, para além da sessão. “Muitas pessoas acham que cuidar da saúde mental é passar 50 minutos com a psicóloga por semana, mas muito do progresso está em observar nossas próprias rotinas e pensamentos. É fazer um pouco todos os dias, como uma planta que se deve regar. E isso não significa anular emoções negativas, mas ter esse cuidado em aprender a como lidar com as adversidades.”