A pandemia do novo coronavírus desencadeou o maior desequilíbrio econômico dos tempos modernos. Empresas e profissionais foram afetados quando as medidas de isolamento social foram implementadas. Mesmo para aqueles que conseguiram se manter em suas funções, muitos se depararam com reduções no salário e também tiveram que se adaptar ao home office. Dedicar boa parte do tempo na quarentena a cursos online foi a opção de muitos trabalhadores que buscaram se qualificar ou adquirir novas habilidades.
Diego Demétrio, gerente de Soluções do Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), diz que todo momento é propício para se qualificar. Mas, nos momentos de crise, faz-se mais necessário: “As pessoas que buscaram abrir suas empresas em 2020, ou já tinham um pequeno negócio, precisaram se qualificar para encarar os desafios impostos pela pandemia. Os empreendedores precisaram se reinventar, digitalizar sua oferta de produtos e serviços, implementar ferramentas de comércio online, investir em marketing digital. E tudo isso implica uma busca por conhecimento.”
Um estudo realizado com 519 pessoas no Estado do Rio de Janeiro pelo Instituto Renoma, unidade de pesquisa mercadológica do Bateiah.com, revela que 26,1% dos cariocas fizeram cursos online para se atualizarem na profissão. Desse grupo, 24,9% são assalariados registrados e 43,3% não têm registro. Por outro lado, 69,1% disseram não ter feito cursos online. Segundo o levantamento, 75% encontram-se desempregados ou procurando emprego.

Procura por cursos dispara

Se reinventar profissionalmente foi a solução encontrada por Adriana Ferreira Chaves, 42 anos. Formada em marketing e recepcionista em uma academia, ela vende brigadeiros e fez cursos online de marketing digital para empreender nas redes sociais: “Tive a sorte de encontrar cursos gratuitos adequados ao meu objetivo e ocupar minha mente com novas perspectivas.”
Não foi só Adriana. O Sebrae registrou no ano passado a marca histórica de 2 milhões de inscritos em seus cursos online. Somente de março a agosto de 2020 houve um crescimento de 63% em relação ao ano anterior, com 1,6 milhão de inscrições. “Sem dúvida, o fato de termos investido de forma maciça em cursos online fez toda a diferença nesse momento em que ainda não é possível reunir as pessoas em um mesmo espaço físico”, constata Diego Demétrio, gerente de Soluções do Sebrae.
A instituição criou alternativas para facilitar o acesso ao conhecimento para os donos de pequenos negócios que buscam oportunidade de qualificação. “Criamos uma série de cursos que podem ser feitos pelo WhatsApp. A novidade foi lançada em julho, durante a pandemia. Diante do sucesso, os cursos agora estão disponíveis para empreendedores de todo país, gratuitamente.”
Foi no período de isolamento que o empreendedor da área de TI (Tecnologia da Informação) Júlio Almeida, 39 anos, também buscou se qualificar. “Quando veio a quarentena, empresas precisaram se adequar ao trabalho remoto. Fui observando um novo nicho e decidi aprimorar minha forma de vender soluções. Fiz diversos cursos online baratinhos e de curta duração, alguns gratuitos, webinars (videoconferências) e continuo fazendo”, conta Júlio.

Nem todos podem

Na avaliação de César Lessa, especialista em Recursos Humanos e Negócios e gestor nacional de cursos na Universidade Estácio, os dados também refletem que não é possível imaginar que fazer um curso online seja viável para todos, como os mais pobres, que, consequentemente, acabam perdendo mais oportunidades. “Isso porque as limitações vão continuar existindo, como dificuldade de acesso à internet, tempo e dinheiro.”
Segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED) de dezembro de 2020, o Estado do Rio teve o pior desempenho do país, com um total de 127.155 postos de trabalho fechados. Foram mais de um milhão de pessoas demitidas no Estado em 2020.
O motorista de aplicativo Augusto Navarro, 54 anos, está inserido nesse grupo. “Não pensei em fazer algum curso online, porque só acesso a internet pelo celular. Também não pude parar de trabalhar durante a quarentena, com prestação do carro para pagar.”
A falta de dinheiro também foi obstáculo para a nutricionista Renata Castro, 37: “Eu tinha planos de fazer um MBA online, mas sem renda fixa, desanimei.”
Para 2021, César Lessa acredita que a vacina contra o coronavírus traz esperança para a retomada da empregabilidade: “Não teremos a mesma quantidade de empregos disponíveis que antes. Entretanto, a pandemia também propiciou a abertura de novos negócios, que demandarão competências que precisam ser contextuais ao momento que estamos vivendo. Por isso, acho que a busca por cursos de qualificação à distância seguirá em alta.”

Vantagem competitiva

Para César Lessa, a pandemia de fato evidenciou a importância de se atualizar profissionalmente. “Se temos uma quantidade maior de pessoas desempregadas, procurando recolocação, naturalmente as empresas vão poder exigir mais. E as que tiverem algo mais para entregar, certamente serão mais bem observadas, porque elas ganham vantagem competitiva.”
O especialista em RH e Negócios destaca que o perfil profissional que vai fazer a diferença exigirá competências que antes não eram tão valorizadas. “Adaptabilidade é uma delas. Buscar por soluções, enxergar pontos favoráveis onde todo mundo está enxergando dificuldades e, principalmente, ter uma inteligência emocional que garanta não só a resiliência, mas também a capacidade de lidar com as suas emoções e a dos outros de maneira madura. Ninguém vai poder dizer que entrou e saiu igual dessa pandemia e, certamente, aqueles que conseguirem aproveitar essa experiência para desenvolver algumas das suas competências, certamente vão ampliar a vantagem competitiva no mercado”.