Mudou o ano, nada mudou. Enquanto esperamos pelo início da vacinação contra a covid-19 no Brasil, setores como o da educação seguem com indefinições principalmente em relação à retomada presencial. No estado do Rio de Janeiro, o retorno das atividades, mesmo com restrições, pode trazer riscos para 600 mil pessoas de grupos de risco, segundo um levantamento da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz).

Se o caminho for seguir com o ensino remoto – como já definido em março e abril na rede estadual –, serão necessárias mudanças tanto estruturais quanto na didática das aulas. Isso porque, segundo pesquisa feita pelo Instituto Informa, unidade de negócio da Bateiah Estratégia e Reputação, três a cada quatro pais acreditam que o ano escolar de 2020 foi negativo.

O levantamento, com 519 no Rio de Janeiro, considerou respostas de 235 pessoas com filhos estudantes. A margem de erro do estudo é de 4% e, seu nível de confiança, de 95%. Para 43,1% destas, o ano escolar não foi bom por falta de estrutura tecnológica para aulas virtuais; outros 31,7% apontaram a falha no ensino pela má adaptação das crianças; por fim, para 25,2%, o ano letivo foi bem sucedido, já que as aulas a distância, pelo computador, foram boas.
A realidade é bastante diferente, porém, ao comparar as respostas entre pais de alunos matriculados no ensino público ou privado. Enquanto no primeiro a rejeição chega a 82,1% – com metade dos entrevistados alegando falta de estrutura mínima –, no segundo, a aprovação do modelo chega a 46,4%, quase o dobro da pesquisa geral.
A condição econômica dos participantes da pesquisa também indica que, quanto maior a renda familiar, maior a satisfação com o modelo adotado pelas escolas na pandemia. O mesmo ocorre com as reclamações quanto a estrutura, mas em sentido contrário – quanto maior a renda, menor as reclamações.

 

Pegos de surpresa

A engenheira Simone Baffini, de 55 anos, afirma que o ano escolar de sua filha, Victoria, de 16 anos, que cursou o segundo ano do ensino médio em uma escola particular na zona sul da capital fluminense, foi perdido. Mesmo com o rápido reinício das atividades de forma remota, a estudante teve dificuldades para se concentrar. “Faltou interação com os alunos, o colégio não tinha como garantir que ela estava assistindo às aulas. Demoraram meses até que o sistema começasse a melhorar um pouco, mas faltou muito.”

Para a professora Clara Marques, que leciona no ensino médio e fundamental, na rede privada, a falta de contato entre estudantes e profissionais de ensino teve um “gigantesco” impacto. “Existe uma dimensão da escola que tem relação com a troca física, olho no olho, o movimento no espaço. A gente perdeu tudo isso.” O distanciamento, segundo Clara, afeta mesmo as escolas privadas, que tiveram maior facilidade de adaptação. “Não podemos pensar em apenas uma rede privada: há escolas e escolas. As instituições de elite, normalmente, já tinham contato com todas as ferramentas que facilitaram o trabalho didático-pedagógico durante o ensino remoto.”

Simone espera que as dificuldades enfrentadas em 2020 sirvam de ensinamento para uma melhor experiência dos estudantes neste ano. “Os alunos não têm maturidade para lidar com avaliações pelo ensino remoto, por exemplo, são muito jovens. Sinto que o ano escolar da minha filha foi jogado no lixo.”

Com um novo ano letivo chegando, Clara acredita que será necessário repensar a maneira de transmitir conhecimento pela internet, com modulação de carga horária e introdução de atividades fora da aula virtual ao vivo. “O computador, a falta da mudança de ambiente e os limites de interação tornam a experiência muito diferenciada e cansativa, para professores e estudantes.”

Calendário indefinido

O prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (DEM), defende a retomada das atividades presenciais nas escolas do município, mas ainda não crava uma data para estudantes do ensino infantil, fundamental e do PEJA (Programa de Educação de Jovens e Adultos) voltarem a frequentar as salas de aula. No mês de fevereiro, os alunos passarão por avaliações de aprendizado para eventuais defasagens no ensino.

Já o calendário do governo estadual, que guia o ensino médio público, aponta o início do ano letivo em março, remotamente, com o mês de fevereiro sendo usado para medir o desempenho dos estudantes – parte deles vestibulandos em 2021. A Secretaria da Educação afirma que 1,2 mil escolas estão em adaptação para voltar a receber a comunidade escolar.

A professora Clara Marques alerta para a necessidade da escola como pilar de assistência social. “Muitos estudantes vão à escola para se alimentar, ou não tem condição de estudar com qualidade em casa por falta de estrutura. Os governos precisam se atentar à assistência dada a esses estudantes para que eles consigam estudar com qualidade e, de fato, aprender de maneira significativa.”

Seguindo decretos do governo estadual, escolas particulares podem retomar atividades presenciais apenas em municípios cariocas com nível de risco de contágio baixo para covid-19. A última atualização, de 7 de janeiro, permite apenas cidades das regiões Serrana e Metropolitana 2.